Foto de um homem branco com cabelo curto e braços levantados segurando a bandeira do movimento LGBTQIA+ #MêsDoOrgulhoAutista #MêsDoOrgulhoLGBTQIA #8M

O que Orgulho LGBTQIA+ e Orgulho Autista têm em comum?

Sabia que no mês de Junho celebramos dois tipos de orgulho? Um deles, Orgulho LGBTQIA+ (28 de junho) é um movimento social organizado com mais de 50 anos de história. O outro, Orgulho Autista (18 de junho) foi celebrado pela primeira vez somente em 2005, mas vem crescendo em importância a cada ano.

Apesar das diferenças temporais, esses orgulhos têm vários pontos de convergência que apontam caminhos para uma sociedade mais respeitosa da diversidade humana.

 

1) Pessoas LGBTQIA+ e autistas enfrentam um longo processo de exclusão.

Como sociedade, temos um passado e presente a superar de patologização pela comunidade médica, de discriminação e estigma social, de rejeição parental e de negação de direitos civis básicos assegurados a grupos tidos como “normais” na sociedade. Para citar alguns, ainda precisamos garantir a pessoas autistas e LGBTQIA+ o direito à infância, à educação, à segurança, à saúde, à autoexpressão e ao trabalho.

 

2) A palavra “orgulho” já carrega seus próprios estigmas.

No senso comum, ter orgulho “pega mal”. Na tradição judaico-cristã, orgulho, entendido por muitas pessoas como arrogância, é um dos 7 pecados capitais.

Para autistas e LGBTQIA+, a palavra possui raízes e significados profundos, muito além dos clichês habituais das publicidades de junho. “Orgulho” é uma resposta a um processo doloroso e recorrente de “envergonhamento” da própria existência:

  • do condicionamento da sua aceitação pelo outro à “correção” ou ocultamento de quem se é,
  • da responsabilização injusta de pais e mães por sua condição,
  • do questionamento da sua fé ou espiritualidade,
  • e até mesmo da sua condição enquanto ser humano saudável e digno de respeito e amor.

Antes de se ter orgulho, é preciso acolher o direito de orgulhar-se sem culpa.

 

3) Orgulho não é automático, nem vem de mão beijada.

Orgulho é um processo não-linear de autodescoberta, de autoaceitação, de desconstrução de mensagens sobre seu valor como pessoa e do exercício de resistência para ocupar seu espaço e utilizar sua voz na sociedade.

Ninguém pode nos dar orgulho: é algo que se conquista.

 

4) Praticar “orgulho” não é um evento único (ou limitado a um dia no ano).

“Sair do armário” demanda constante avaliação e decisão, em diferentes contextos, diante de diferentes pessoas.

Apresentar seu orgulho no mundo é um movimento consciente (e privilégio de quem possui características “menos visíveis”) que exige discernimento e maturidade para entender quando temos segurança, força e energia para lutar (com custos pessoais) por melhores condições para sua comunidade e para as gerações futuras.

Nesse sentido, exercer seu orgulho é ao mesmo tempo uma ação individual e política, com consequências concretas no mundo.

Neste texto, abordo a importância política da autodeclaração de líderes neurodivergentes.

 

5) Orgulhos se sobrepõem.

Estudos recentes sobre sexualidade destacam que a proporção de pessoas autodeclaradas LGBTQIA+ na comunidade autista é 3 vezes superior à população neurotípica.

Não acredito que haja uma razão de ordem (puramente) biológica para essa diferença, mas certamente (também) uma de ordem psicossocial. Viver sua verdade e praticar orgulho em uma dimensão fortalece o caráter para exercê-lo em outra.

 

6) Orgulho é pertencer.

Orgulho não surge no vácuo. Não existe “desenvergonhamento” sem apoio e reconhecimento do outro.

Toda pessoa que tem orgulho, em algum momento teve alguém em sua vida que a amou, a acolheu e reconheceu seu potencial e valor intrínseco: uma avó, mãe, pai, professora, cônjuge ou mentor.

Outras não tiveram a mesma sorte e só conseguem desenvolver orgulho mais tarde, quando encontram família entre pares.

Comunidade importa porque gera pertencimento, combustível do orgulho.

Pessoas neurodivergentes e LGBTQIA+ conectam-se profundamente e prosperam quando encontram outras pessoas como elas. Sempre me surpreendo como entre neurodivergentes esse reconhecimento mútuo geralmente antecede qualquer diagnóstico formal.

 

Meu orgulho vale mais do que o seu?

Em tempos de celebração dos orgulhos, é fácil cair na armadilha da comparação. Aplaudimos quem expressa seu orgulho publicamente e condenamos quem o reserva para o círculo íntimo.

Mais produtivo seria:

  • Compreender as dores e renúncias que acompanham a construção deste orgulho,
  • Interromper atos públicos de envergonhamento,
  • Reconhecer que cada pessoa autista e LGBTQIA+ está em um momento específico em sua jornada de orgulho
  • E atentar-se para nosso julgamento não compor mais experiências de exclusão e envergonhamento.

Junho vai passar! Minha esperança é que durante todo o ano possamos continuar apoiando as comunidades LGBTQIA+ e autista… Até o dia em que orgulho nem seja mais necessário.

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